Regras para aeroportos opõem grupos no governo

27/08/12 - SINA - Concessão de Aeroportos

Por Daniel Rittner, de Brasília, para Valor Econômico

A elaboração do pacote de novas concessões de aeroportos jogou o
governo em uma zona de atrito constante entre dois grupos que guardam
divergências ideológicas. Ao contrário do que vinha ocorrendo no
desenho das medidas para rodovias e ferrovias, áreas nas quais a
presidente Dilma Rousseff formou convicção rapidamente do caminho a
seguir e seus principais auxiliares falavam a mesma língua, o mal
estar entre essas duas alas se acentuou com a hesitação dela em torno
do futuro dos aeroportos. Nada está fechado até agora.

O primeiro grupo é chamado de "privatista" no Palácio do Planalto.
Estão nele o ministro Wagner Bittencourt (Secretaria de Aviação
Civil), Luciano Coutinho (presidente do BNDES), Marcelo Guaranys
(presidente da Agência Nacional de Aviação Civil) e Antônio Henrique
Silveira (secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da
Fazenda).

Todos defendem novas concessões, começando pelo Galeão (Rio) e Confins
(Belo Horizonte), mas incluindo pelo menos um aeroporto no Nordeste.
Eles também levaram ao gabinete presidencial a ideia de privatizar
dois terminais médios - Goiânia e Vitória - que têm um histórico de
problemas graves com o Tribunal de Contas da União (TCU) e exigem
investimentos em ampliação da capacidade.

No segundo grupo, destaca-se o secretário do Tesouro, Arno Augustin.
Ele chegou ao ápice de sua força no governo Dilma e hoje é considerado
o "cérebro" da ala que combate novas privatizações e defende o
fortalecimento da Infraero. Nenhuma reunião sobre aeroportos é feita
sem a sua presença. O grupo tem ainda a ministra-chefe da Casa Civil,
Gleisi Hoffmann, e o secretário-executivo dela, Beto Vasconcelos, uma
espécie de "pupilo" de Dilma.

O grau de divergências e a incerteza da presidente podem levar ao
adiamento do anúncio de novas medidas. "Vamos deixar isso para
outubro", sugeriu Arno, na última reunião. Foi uma das poucas vezes em
que Dilma demonstrou discordância com ele, na frente dos demais
auxiliares, e cobrou empenho para fechar o restante do pacote em
setembro.

Arno mexeu no plano de aviação regional, elaborado durante meses pela
Secretaria de Aviação Civil, para incluir o ressurgimento de um
subsídio do governo às companhias aéreas para viabilizar novas rotas
entre pequenos municípios do interior. E foi pai da ideia de fazer
parcerias público-privadas (PPPs) para atrair um sócio estrangeiro à
Infraero, que continuaria como majoritária na gestão dos aeroportos.

Os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento)
chegaram a participar de algumas reuniões, mas se manifestaram de
forma tímida e não são considerados protagonistas no debate. O
comportamento do presidente da Infraero, Gustavo do Vale, intriga os
dois lados. Ele chegou à estatal como um entusiasta das concessões,
mas hoje acredita que tem condições de tocar obras no Galeão e em
Confins com recursos públicos, além de ressaltar o fato de que pode
comprometer sua capacidade financeira caso perca mais aeroportos
lucrativos para a administração da iniciativa privado. Nas palavras de
um conhecedor do que se passa nessas reuniões, Vale tem "coração
privatista" e "cabeça estatizante", mas manifesta apoio à ideia das
PPPs.

Inclinada a favor do segundo grupo, Dilma determinou uma ida de Gleisi
e de Bittencourt à Europa, para conversas pessoais com grandes
operadores de aeroportos. Quatro gigantes serão sondadas e receberão
explicações detalhadas sobre o modelo alternativo que ela pensa em
aplicar: a alemã Fraport (Frankfurt), a francesa Aéroports de Paris
(Charles de Gaulle), a britânica BAA (Heathrow) e a holandesa Schipol
(Amsterdã).

Todas essas operadoras participaram do leilão de fevereiro, em
associação com grupos nacionais, mas perderam a disputa por Guarulhos,
Viracopos e Brasília. Em contatos informais com empreiteiras
brasileiras, disseram não ter interesse em uma associação com a
Infraero nos moldes das PPPs propostas agora pelo governo. A missão de
Gleisi e Bittencourt à Europa estava sendo programada para esta semana
e pode ser confirmada hoje.

Dilma, agora disposta a levar adiante as PPPs, tem demonstrado
irritação nas últimas reuniões e seus auxiliares estão convencidos de
que sua decisão ainda pode tomar um rumo diferente. No ano passado,
quando os assessores presidenciais entraram em sua sala para uma
reunião conclusiva sobre a proposta de privatizar o aeroporto de
Guarulhos, ela surpreendeu a todos: "Quero incluir Viracopos e
Brasília". Ninguém tinha sido avisado e os dois outros aeroportos
sequer constavam da pauta. Para um auxiliar de Dilma, é um sinal de
que "às vezes ela decide com o fígado".

Se vingar o modelo de PPPs com participação majoritária da Infraero, é
provável que ela ganhe mais flexibilidade nas contratações, saindo
definitivamente das amarras da Lei 8.666/93 (Lei de Licitações). Se as
dificuldades levarem Dilma a optar pela continuidade das
privatizações, é certo que haverá mudanças.

Nesse caso, a tendência mais forte é que não haja obrigatoriedade de
os consórcios incluírem uma operadora estrangeira no grupo, como
ocorreu no leilão de fevereiro. Uma vez definidos os vencedores da
disputa, haveria a exigência de, aí sim, encaixar uma grande operadora
no negócio. A outra hipótese é aumentar o requisito de movimentação
mínima de passageiros em um aeroporto estrangeiro. Esse número foi de
5 milhões por ano no primeiro e pode subir a níveis próximos de 30
milhões por ano, limitando a concorrência às maiores operadoras
mundiais.

Hoje, o retrato é de pouca força política do grupo a favor das
privatizações. Bittencourt e Guaranys foram apontados como
responsáveis pela ausência dos grupos mais robustos na lista de
vencedores do primeiro leilão. Antônio Henrique Silveira tem estudado
profundamente o assunto, mas tem evitado entrar em conflito, nas
reuniões. Apesar de Gleisi e Beto Vasconcelos estarem a poucos metros
do gabinete de Dilma, os assessores da presidente avaliam que o futuro
dos aeroportos hoje depende, em boa parte, das propostas que apenas
duas pessoas lhe levarem: Luciano Coutinho e Arno Augustin.

Enquanto isso, o desencontro das informações veiculadas recentemente
sobre as concessões de aeroportos, que reflete a indefinição dentro do
próprio governo, constrange o Palácio do Planalto e tem levado o
gabinete presidencial a disparar telefonemas que buscam identificar,
entre os participantes das reuniões, quem está na origem dos
vazamentos.

Fonte: http://www.sina.org.br/turbulencia/

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