PRIVATIZANDO AS PRIVATIZAÇÕES ou AS VIRTUDES DA INOPERÂNCIA

Por Carlos Chagas

A vida costuma ser mais
fascinante e surpreendente do que a ficção. Muitas vezes, para dar
alento a quem resiste. Ontem, dia do retrocesso, o governo Dilma
Rousseff anunciou nova onda de privatizações, quer dizer, de doação
de patrimônio público a uns poucos privilegiados que se valem da
ficção para enriquecer e aumentar seu poder. Só que a vida sempre
revela a fraqueza do embuste.

Caiu por terra, em 24
horas, a mentira de ser a iniciativa privada mais eficiente, motriz
primeira do desenvolvimento, enquanto o Estado só cria despesas e
gera desperdício e corrupção.

Ficamos sabendo estarem
no limiar da falência as empresas aéreas Tam e Gol, além de
penduricalhos. Basta ler seus balanços, mesmo maquiados. Seguem no
rumo da Panair, da Varig, da Real, da Cruzeiro do Sul, da Transbrasil,
da Vasp e de outras. Seu prejuízo é de centenas de milhões. E mais
crescerá. Se ainda teimam em voar, e será por pouco tempo, a causa
repousa na ajuda nem sempre honesta dos cofres públicos, das
benesses fiscais e do sacrifício de seus funcionários.

Demonstra a natureza
das coisas que certas atividades devem obrigatóriamente ser
estatais, quer dizer, pertencer ao todo, não a partes privilegiadas.
Os transportes públicos são uma delas, tanto faz se aéreos, terrestres
ou marítimos. Da mesma forma a educação, a saúde e a segurança
públicas. Sem esquecer a indústria pesada, a geração de energia e
o controle do sistema financeiro.

Nas últimas décadas
assistimos o desmonte do patrimônio estatal, isto é, do povo, em nome
de uma falsa eficiência construída às custas da compressão dos
salários e das dificuldades do trabalhador, favorecendo grupinhos
que sem nada investir apropriam-se dos investimentos públicos e
insistem em proclamar as virtudes de sua inoperância. Os
transportes aéreos constituem apenas um exemplo, aqui referido por
conta da coincidência entre a mentira de ontem, quarta-feira, e a
verdade de hoje, quinta.

Entre outros objetivos,
o PT formou-se para sustentar a defesa do poder público, a
prevalência da sociedade sobre minorias egoístas. O tempo passou e os
companheiros cederam à tentação de valer-se da estratégia que os
beneficiaria e transformaria em comensais do elitismo. Que um
sociólogo tivesse traído ideais antes apregoados por ele, tratou-se
de uma individualidade fraca. Mas admitir essa mudança numa vanguarda
que um dia pretendeu a reconquista do coletivo e a prevalência do
social, deve ter doído muito em quem neles acreditou. Talvez por
isso boa parte debandou. Os que ficaram, transfigurando-se,
aliaram-se à cartilha dos adversários do passado. Hoje, são cultores
do neoliberalismo. Servem-se dele para exercer e preservar o poder
que não merecem mais, cegos diante da maré que logo os asfixiará,
como vai acontecendo lá fora.

Que diferença existe
entre o nosso governo e aqueles que na Alemanha, Inglaterra, Espanha,
Grécia, Portugal e alhures praticam, às custas dos direitos sociais,
a política perversa da doação de bens públicos? Servem aos mesmos
que através dos tempos tem sido os geradores da injustiça, da
perversidade e das crises inevitáveis.

Pois bem: mais cedo do
que imaginavam com a própria ficção, engolem a resposta da vida.
Vão fazer o quê? Privatizar a privatização das empresas aéreas? Ou
abrir ainda mais as burras do tesouro para preservá-las por outros
quinze minutos?


Fonte: http://www.claudiohumberto.com.br/artigos/?id=326863

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