Apenas 60% dos casos de assassinatos de homossexuais têm solução no Amazonas

05 Mai 2013 . 12:00 h . Annyelle Bezerra . portal@d24am.com

Falta de normatização da homofobia no País é apontada pelo Fórum LGBT
como uma das principais causas da impunidade e das dificuldades
enfrentadas pela classe.

Manaus - Dados do Fórum Amazonense LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e
Transexuais) apontam que 40% dos assassinatos praticados contra
homossexuais, no Amazonas, seguem impunes. Conforme o secretário-geral
da entidade, Jeffeson Pereira, dos 15 homicídios cometidos por
homofobia, no ano passado, apenas nove foram solucionados.

A falta de normatização da homofobia como crime, por parte do Poder
Legislativo, da criação de estrutura e de contratação e capacitação
dos profissionais de segurança pública são apontados por Pereira como
algumas das principais causas da impunidade e das dificuldades
enfrentadas pela classe.

"Já tivemos relatos de vítimas que, ao chegarem à delegacia para
denunciarem a violência homofóbica, foram questionadas pelo atendente
sobre a causa de viverem com mulheres, já que em Manaus existem tantos
homens", afirmou.

A situação, segundo ele, que também é mestrando em serviço social pela
Universidade Federal do Amazonas (Ufam), intensifica a violação de
direitos dos homossexuais, incita a autoculpabilização da vítima e
reitera a sensação de injustiça por parte do Estado.

"Além de tudo, casos como este demonstram a invisibilidade da
homofobia às lésbicas, a chamada lesbofobia, pois além das
instituições do poder público não estarem preparadas para receber
casos do tipo, as mulheres lésbicas sofrem pela sua invisibilidade
social", ressaltou.

Apontado como líder no ranking entre os Estados da Região Norte com
maior índice de violência homofóbica letal, o Amazonas registrou, em
2012, 15 mortes de homossexuais, segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB).

Do total de assassinatos, 14 ocorreram em Manaus, apontada no
relatório como a capital que mais matou LGBTs no Brasil, em 2012. O
índice de mortes contra LGBTs, no Estado, triplicou entre 2012 e o ano
anterior, quando cinco casos foram registrados.

Em 2011, após Manaus, Parintins era o município com o maior índice de
homofobia no Amazonas. Na época, a capital do Estado contabilizou 116
casos de violência física, psicológica, institucional, patrimonial,
discriminação e negligência. Em 2012, três homossexuais foram
assassinados em Parintins.

Nos quatro primeiros meses deste ano, cinco homossexuais já foram
assassinados no Amazonas. Dados da Secretaria Nacional de Direitos
Humanos (SDH) revelam que, no ano passado, 57 denúncias de violência
contra LGBTs foram contabilizadas no Estado através do Disque 100,
índice 338,4% maior em comparação com 2011, quando apenas 13 queixas
foram recebidas.

Segundo o secretário-geral, homossexuais de cor parda e preta, com
faixa etária de 25 a 35 anos (inserida na faixa etária nacional entre
20 a 40 anos), encontram-se entre os mais vulneráveis a assassinatos
no Amazonas.

Nos casos envolvendo gays e lésbicas, o estudioso destaca que os
assassinos costumam ser pessoas conhecidas no meio social das vítimas.
Enquanto isso, no caso dos homicídios contra travestis, clientes ou
pessoas desconhecidas praticam o crime por considerar os homossexuais
inferiores.

"A população LGBT assassinada exerce diferentes profissões e está
presente em todas as ocupações e classes sociais. Predominam os
travestis profissionais do sexo, seguidos pelos agentes de saúde,
professores, cabeleireiros, empresários, pais de santo, cantores,
políticos e jornalistas", informou Pereira.

Violência

Todos os homicídios ocorridos no Amazonas, de acordo com o Fórum,
foram praticados com requintes de crueldade e violência extremada,
caracterizados como crimes de ódio e ocorreram com o auxílio de armas
de fogo ou arma branca (faca, punhal, canivete, foice, machado,
tesoura).

Espancamentos, pauladas, pedradas, marretadas, queimaduras,
afogamentos, atropelamentos, enforcamentos, degolamentos, asfixia,
empalamentos, violência sexual e tortura também foram identificados.
"A residência, no caso dos gays, é o local predominante dos
assassinatos. Já os travestis e transexuais são mortos na rua",
explicou Pereira.

Vítimas da homofobia relatam agressões

Agredido em março de 2003 por dois vizinhos homofóbicos, o presidente
do Sindicato dos Psicólogos do Amazonas, Alberto Jorge Silva, afirma
ter sentido na pele o impacto da impunidade no Amazonas.

"Denunciei, eles foram presos em flagrante e soltos logo depois. Até
hoje sou obrigado a ouvir ameaças de morte e xingamentos por ser
homossexual", afirmou.

Com três fraturas no rosto, na época, após ser espancado, Silva
revelou que foi obrigado a fazer um empréstimo de R$ 8 mil para
custear a cirurgia plástica necessária para que pudesse voltar a ter
uma vida normal.

"Fiquei mais de seis meses aguardando para fazer a cirurgia. Neste
período, tive de abandonar meus pacientes e conviver com os
comentários orgulhosos dos agressores pela vizinhança comemorando a
deformação que me causaram", disse.

Dez anos após a violência, o psicólogo revelou que as ameaças
continuam e que nem mesmo os reincidentes pedidos de apoio da polícia
durante a ação dos agressores são capazes de reverter a impunidade do
caso.

"Já perdi a conta de quantos Boletins de Ocorrência já fiz. O pior é
que no BO não existe a tipificação homofobia", diz.

Esfaqueado no pescoço e nas mãos em março deste ano por um
ex-companheiro em sua própria residência, Marcelo Farias* contou que
além do seu agressor ter sido liberado pela polícia, precisou ouvir
críticas da atendente ao recorrer à delegacia para registrar a
tentativa de homicídio.

"Lembro que uma das informações que eles pediam era o número da casa
do agressor e quando eu informei não saber, ela me criticou por sair
com pessoas que eu não conhecia", informou.

Farias contou ainda que apesar da agressão ter ocorrido no dia 18 de
março, apenas na última sexta-feira, o exame de corpo de delito teve
seu resultado encaminhado para a delegacia. "Não sei se é uma raridade
do sistema (de segurança) ou uma regra por ser um caso de homofobia",
afirmou, destacando que, segundo amigos, seu agressor lamenta a sua
recuperação.

* O nome foi mudado a pedido do entrevistado.

Fonte: http://www.d24am.com/noticias/amazonas/apenas-60-dos-casos-de-assassinatos-de-homossexuais-tem-solucao-no-amazonas/85866

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